Habituados que estamos a definir Kata como "forma", ou como uma "sequência de técnicas de defesa e ataque que representam um combate real contra quatro adversários hipotéticos", deixamos aqui algumas observações que nos são transmitidas pelo Sensei Kenji Tokitsu no seu último livro.
Ao ponderar o significado de Kata como o conjunto básico de movimentos na prática de uma arte (1), comecei a descobrir a estrutura mental e o tipo particular de identificações (2) que cobriu cada prática.
A definição de Kata a que eu cheguei a partir deste estudo preliminar acabou por ser a expressão mais evidente de uma realidade social que era muito mais vasta e muito mais difícil de entender.
Em Japonês, a palavra Kata tem dois significados principais escrito com dois ideogramas:
1. "forma" 形 - etimologia: "esboço de uma representação exata como que usando pinceladas";
2. "molde" 型 - etimologia: "forma original feita a partir de terra". Durante muito tempo, este ideograma também significou "faixas ou vestígios deixados para trás", "forma ideal", "lei", "costume".
A palavra Kata, significa então duas coisas. Primeiro, significa a imagem de uma forma ideal e seu contorno exato como ela vai ser representada. Em segundo lugar, começou a ser usada para designar a codificação e transmissão de conhecimento baseado num conjunto determinado de movimentos técnicos com o corpo, mas não sabemos em que era esse significado surgiu. Esse aspecto histórico é, de fato, bastante significativo.
Na realidade, a Kata desenvolve-se ao longo de uma tradição japonesa e deve ser olhada no seu contexto histórico.
Quando dizemos: "Eu tenho um corpo, eu tenho uma mão ..." uma separação já está em vigor. Este tipo de formulação antes não existiam em japonês, que foi inventado para traduzir idiomas Ocidentais. Esta separação não é sentida na técnica "wasa" ( técnica conectada ao corpo) (3). Qualquer um que adquire esta espécie de técnica tem a experiência de uma unidade total: "Eu sou o corpo, eu sou a mão" - além disso, "Eu sou a técnica, eu sou o que é feito". Neste sentido, o eu desaparece.
Quando dizemos: "Eu tenho um corpo, eu tenho uma mão ..." uma separação já está em vigor. Este tipo de formulação antes não existiam em japonês, que foi inventado para traduzir idiomas Ocidentais. Esta separação não é sentida na técnica "wasa" ( técnica conectada ao corpo) (3). Qualquer um que adquire esta espécie de técnica tem a experiência de uma unidade total: "Eu sou o corpo, eu sou a mão" - além disso, "Eu sou a técnica, eu sou o que é feito". Neste sentido, o eu desaparece.
(1) Tokitsu refere-se aqui a arte como perfeição, incluindo o Noh, o Kabuki ou a Ikebana e não só a arte da guerra ou do combate.
(2) O autor usa a palavra "identificação" ao longo do texto, no sentido de "associar-se inseparavelmente com" (N. T.).
(2) O autor usa a palavra "identificação" ao longo do texto, no sentido de "associar-se inseparavelmente com" (N. T.).
(3) Não nos esqueçamos que Kenji Tokitsu foi aluno do Sensei Funakoshi, que dizia que "muitas vezes, a quem falta a qualidade essencial da total seriedade, pode refugiar-se na teoria. A verdadeira prática não se faz com palavras, mas com a composição do corpo inteiro. O que aprenderes por ter ouvido aos outros, esquecê-lo-ás facilmente; o que aprenderes com o teu corpo, recorddá-lo-ás toda a sua vida." Mas também sabemos que para nós, ocidentais, a prática também tem de ser compreendida...
Permitam-me levantar algumas considerações a respeito de compreender os Kata.
ResponderEliminarOs ideogramas apresentados no tópico para a palavra japonesa KATA 型/形 têm realmente as traduções apresentadas, mas o que o artigo não menciona é que estes dois ideogramas são usados indiscriminadamente no Japão para se referirem às "formas/padrões" feitos no Karate. Por isso, divagarmos sobre qual das duas traduções é a mais coerente (ou se ambas são representação da idéia de "forma") talvez não faça muito sentido para posicionarmos o assunto "Kata".
Contudo, achei interessante a frase: "(...)tradição japonesa e deve ser olhada no seu contexto histórico."
A questão é: qual é o "contexto histórico" dos Kata a que se refere o artigo?
Coloquemos as coisas nos seus devidos lugares:
Historicamente, há uma ENORME diferença entre o Karate 唐手 praticado sem fins de difusão popular (por exemplo Higaonna Kanryô) e o Karate 空手 exportado para o Japão. Ah! Sim! Há dois pares de ideograms diferentes para a palavra "Karate"...
唐手 Karate - Estes ideogramas também podem ser lidos "Tôde".
空手 Karate - A versão final para a designação da arte praticada hoje em dia.
Além disso, como é sabido (ou pelo menos deveria ser), o ensino dos Kata que conhecemos hoje não é nem de longe o espelho de como era o ensino original Por quê?! Porque antigamente o mestre ensinava o Kata que mais se adaptasse a determinado tipo de aluno e só ensinava a totalidade (ou quase totalidade) ao aluno que o iria suceder. Assim, um Kata que era ensinado para um aluno não era obrigatoriamente o Kata que seria ensinado para outro.
O contexto de "aprender TODOS os Kata" de determinado estilo é "coisa recente".
O que nos leva a uma consideração simples: não seria a forma antiga de transmissão do Kata a mais coerente?
Vejamos... para um estilo como o Gôjû-ryû 剛柔流 com um pouco mais de uma dezena de Kata, aprender todos os Kata parece não ser problema intransponível (mesmo que alguns mestres mais "iluminados" do que outros apresentem tal esforço como sendo "inatingível em uma vida apenas").
Por outro lado, um estilo como o Shitô-ryû 糸東流 que engloba os Kata de Itosu 糸洲 e Higaonna 東恩納... Eu não faço idéia da totalidade de Kata que devem ser aprendidos (adicione-se a isso a mesmíssima idéia anterior de que dominar um Kata "é um esforço inatingível em uma vida apenas") ... o que nos leva novamente à mesma questão anterior: não seria a forma antiga de transmissão do Kata a mais coerente?
Naturalmente a resposta é bastante simples: no contexto ACTUAL, adaptar os Kata aos alunos está fora de questão porque faria diminuir o número de instrutores e isso é "inconveniente" para os propósitos de difusão de um determinado estilo de Arte Marcial.
Quanto ao parágrafo:
"Quando dizemos: "Eu tenho um corpo, eu tenho uma mão ..." uma separação já está em vigor. Este tipo de formulação antes não existiam em japonês, que foi inventado para traduzir idiomas Ocidentais. Esta separação não é sentida na técnica "wasa" ( técnica conectada ao corpo) (3). Qualquer um que adquire esta espécie de técnica tem a experiência de uma unidade total: "Eu sou o corpo, eu sou a mão" - além disso, "Eu sou a técnica, eu sou o que é feito". Neste sentido, o eu desaparece."
Não entendo o que isso tem a ver com "Compreender um Kata".
Compreende-se um Kata através dos seus Bunkai 分解. Onde:
分 BUN - Parte(s)
解 KAI - Compreender, entender, saber.
Para mim, compreender um Kata implica compreender as suas partes, sua aplicação e objetivos de cada movimento. Isso implica estudar a mecãnica do seu funcionamento, o resultado pretendido referente a cada técnica e sua aplicação como transmissão de ensinamento original e perpetuação do estilo que se pratica.
Quanto ao "eu" e "não-eu"... cabeça ocupada não tem tempo para divagar.
Treina-se e estuda-se. nada mais do que isso!
押忍 OSU!
Caro Joseverson:
ResponderEliminarProcurei transmitir algo presente no livro de Kenji Tokitsu e a que normalmente não estamos atentos. Tokitsu chega a levar ao extremo o conceito de Kata ao entender Kata como uma maneira de viver... e penso que quando se refere ao contexto histórico tenta levar-nos a reflectir nos vários contextos históricos, de modo que a sua observação é oportuna.
O corpo e a mão, em relação ao compreender a Kata, nos dizeres de Tokitsu, referem-se à execução da Kata e sua compreensão com sendo a forma, o conteúdo e o indivíduo uma só coisa. Eu sou a minha Kata e a minha Kata demonstra quem eu sou...
Só lendo o livro... e relendo, pois é difícil chegarmos ao fundo do pensamento de Tokitsu.
Grande abraço e obrigado!