terça-feira, 17 de abril de 2012

REIHŌ (礼法) – A etiqueta, parte integrante do KARATE-DŌ (空手道) (2)


(conclusão do post anterior...)



Tanto no Kata como no Kumite, no começo e no final das aulas, no início e no fim do trabalho com o parceiro... fazemos sempre a saudação! Portanto, podemos afirmar com 100% de certeza que a saudação é algo que se faz em qualquer momento do Karate-dō! Ao entrar no dōjō e ao sair, ao executar técnicas, ao praticar ou ao competir com ou contra o “outro”... mesmo na vida do dia a dia entre companheiros de treino. E, assim sendo, o treino do Reihō é de uma importância vital para a prática do Karate-dō!

Se isso tudo é verdade, será que não estamos a negligenciar o significado mais elementar e simultaneamente mais profundo, a parte mais importante do Karate-dō? Não estaremos a ser indulgentes para com o respeito pela arte e pelo outro ser humano ao nosso lado, quer seja companheiro quer seja adversário?

人敬メールー、デゥー敬メー。
CHŪ UYAMĒRŪ, DŪ UYAMĒ.
Se respeitares os outros, eles respeitar-te-ão a ti.

Ao deixar de lado a prática do que deveria ser a etiqueta e os "bons costumes tradicionais" do Karate-dō, será que estamos a seguir a máxima acima indicada e aquela com que se iniciou o post anterior ou a etiqueta é mais um daqueles movimentos "automáticos" que se executa "porque nos foi dito que era assim"?

Será que não somos capazes de ver o que está diante do nosso próprio nariz?

Mas outro aspeto que é importantíssimo para além do Karate-dō começar e acabar com a saudação, é o "durante"... o espírito da saudação (o seu significado, o seu conteúdo, o seu valor) deve estar sempre presente (deve ser praticado e vivido) durante o decorrer da atividade: treino, competição, etc... É a vivência desse espírito no “durante” que depois é transferido para a vida diária!

O ensinamento é perpetuado pela prática do próprio Karate-dō... mas só há ensinamento quando existe aprendizagem…  e a etiqueta só é ensinada quando é aprendida e o “outro” demonstra que a SABE e a CONHECE!

一、空手道は礼にはじまりり、礼に終ることを忘れるな。
HITOTSU - KARATEDŌ WA REI NI HAJIMARI, REI NI OWARU KOTO O WASURERU NA.
Importante, não se esqueça que o Karate-dō deve iniciar com saudação e terminar com saudação.

Sabemos e damos a real importância à saudação na nossa "Via", no nosso "Caminho" do Karate-dō? A “Via”, o “Caminho” são o próprio Karate-dō e a etiqueta faz parte dele.

Lembrem-se que a força de uma construção está na força do seu pilar mais fraco. Se o pilar mais fraco não aguentar, toda construção desmorona.

Há que haver tempo durante o treino para “treinar o treino” do Reihō...

E terminamos aqui com as questões daquela criança que pela primeira vez foi assistir a um campeonato de Karate (1).

A certa altura pergunta ao pai:
– Porque é que aqueles senhores de gravata e casaco azul estão sempre a baixar a cabeça uns para os outros?
– É a saudação meu filho, é um cumprimento.
– Mas eles cumprimentam-se mesmo?

(1) Armando Inocentes, 2009, Ritos, Reproduções e Crenças: uma análise socio-pedagógica, in J. Salgado e L. Pereira, “Karaté: entre a tradição e a modernidade”, Lisboa, FNK-P, pp. 117-158.

 Nota: este texto foi redigido em conjunto por Joséverson Goulart e Armando Inocentes

6 comentários:

  1. OSS Inocentes Sensei!

    Uma vez achei um texto interessante sobre o mesmo tema.
    http://www.artesmarciais-em-estudo.blogspot.com.br/2010/05/reigi-no-saho-etiqueta-formal-das-artes.html

    Um grande abraço

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  2. 人敬メールー、デゥー敬メー。
    CHŪ UYAMĒRŪ, DŪ UYAMĒ.
    Se respeitares os outros, eles respeitar-te-ão a ti.

    Gosto desta frase. Mas o que de mais importante aprendi, comecei a aprender (talvez tardiamente), e tento reaprender é o seu contrário - "Se te respeitares, os outros respeitar-te-ão a ti". Portanto não há respeito pelo outro enquanto não nos auto-respeitarmos e assim sucessivamente. Daí o valor de qualquer prática que tenha como principio de base a formação de crianças, jovens, jovens adultos, capazes de se respeitarem a si próprios (e aos outros por extensão).
    Uma prática que estimule o auto-conceito, a auto-actualização, a auto-motivação. No fundo a Pedagogia é a ciência que comanda este pensamento, o Desporto, as Artes Marciais, os Saberes, as Artes ou as Ciências são os conteúdos em que esta forma se expressa.

    É de notar, que Funakoshi, o "Pai do Karaté Moderno", mais do que um executor virtuoso ou um grande lutador tenha sido, maioritariamente um Pedagogo, um versado nos clássicos confucinanos e taoista. Não é de estranhar que em muitos Kamiza a sua fotografia ainda paire sobre nós, sentado num colchão de palha, com um livro nas mãos, sobre um fundo de livros e manuais empilhados. E curioso é que essa mesma foto, tenha sido tantas vezes alterada (ora com o Dojo Kun por fundo, ora com um fundo cinzento), como para "atenuar" o pendor académico e literato daquele que foi até uma certa década, o karaté mais popular e disseminado em todo o mundo.

    (mas isso são outros quinhentos),

    Um abraço, e cumprimentos ao dois autores por mais este artigo.

    Maria Camarão

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    1. Cara Maria Camarão.
      Permita-me comentar dois pontos a que te refferes a respeito da etiqueta:

      1 - "Resumindo, devemos conhecer e cumprir com a etiqueta, mas esta, frequentemente, não nos diz nada sobre a verdadeira natureza ou carácter de quem temos pela frente."

      2 - "Não querendo transformar isto num debate de Filosofia, pergunto: a etiqueta é passível de ser ensinada e obedecida, mas a Moral, e num sentido restrito a Ética, serão elas passíveis de ser ensinadas por via institucional? O sentido moral não nascerá precocemente no meio familiar? Será possível controlar a jusante as acções do indivíduo em Sociedade, o no exercício da sua profissão (Ética)?"

      Bem... na verdade, a etiqueta não diz realmente (e absolutamente) NADA sobre a verdadeira natureza ou caráter de quem temos pela frente porque essencialmente não é esta a sua função.
      A função da etiqueta é padronizar determinado comportamento diante de siturações específicas, independentemente da natureza ou caráter de quem temos pela frente. A etiqueta é "standard" para todos!
      O problema é que algumas pessoas, mesmo com muitos anos de prática de Karate, não fazem a menor idéia a que se refee a etiqueta, daí vermos as atitudes vegonhosas espalhadas na Internet.

      Quanto à pegunta «fundamental» (pois deveria ser esta a preocupação de todos que ensinam): "(...) a etiqueta é passível de ser ensinada e obedecida, mas a Moral, e num sentido restrito a Ética, serão elas passíveis de ser ensinadas por via institucional?"
      A resposta é bastante simples: SIM! Estas podem ser ensinadas por via institucional.
      Frequentemente os instrutores esquecem a sua função primordial: os instrutores devem instruir! Isso significa que os instrutores tem obrigação de ensinar a etiqueta (atenção agora!)... porque esta etiqueta FAZ PARTE DO KARATE! Posições do tipo "Não vou ensinar etiqueta porque ela não se adapta a todos dentro do dôjô" está totalmente fora de questão! Portanto, os instrutores não só tem obrigação de ensinar corretamente a etiqueta como têm obrigação de fazer com que a mesma seja cumprida!
      É aqui que a situação fica "delicada", porque é necessário saber "como ensinar a etiqueta e conseguir adaptá-la a todos dentro do Dôjô".
      Novamente a resposta é simples: os Karateka ensinam Karate! É sobre KARATE que estamos a falar.
      Se um aluno não estiver disposto a aprender KARATE, o instrutor deve ter uma conversa com este aluno e verificar se o mesmo está disposto a aprender KARATE ou se está no Dôjôpara despejar frustrações contra os outros ou fazer notar a falta de controlo pessoal. E todos nós sabemos que não existe instrutor que não conheça a índole dos seus alunos.
      Neste caso, o instrutor deve ser honesto o suficiente para dizer ao aluno em questão que talvez o Karate não seja a atividade ideal para ele... Eu já tive conversas deste tipo e sei que o assunto é de simples resolução porque, numa análise elementar, as boas ou más ações dos alunos é o espelho do tipo de ensino feito pelo instrutor.

      Cumprimentos.

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  3. Caro Armando:

    Há aqui um parágrafo de extenso pendor pedagógico que durante a leitura pode passar despercebido: "O ensinamento é perpetuado pela prática do próprio Karate-dō... mas só há ensinamento quando existe aprendizagem… e a etiqueta só é ensinada quando é aprendida e o “outro” demonstra que a SABE e a CONHECE!" NÃO É A PRÁTICA QUE PERPETUA O ENSINAMENTO... muitas vezes a prática deturpa o ensinamento! SÓ HÁ ENSINAMENTO QUANDO EXISTE APRENDIZAGEM - muitos, por muito que ensinem, nada os outros conseguirão aprender com eles. Mas ficaram convensidos que ensinaram... SABER e CONHECER - muito bem (há quem confunda um com o outro, ou que entenda que ambos são a mesma coisa!), mas só um nada é, teremos de reunir os dois para ter algo maior.


    Cara Maria Camarão:

    Penso que quem respeita o outro respeita-se a si próprio...
    E já agora, por que não desmistificar essa história de «Funakoshi, o "Pai do Karaté Moderno"»?

    Cumprimentos a todos.
    José Brás

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  4. Já se sabe que o Funakoshi não é o pai do Karaté Moderno. Circunstancialmente foi o primeiro a levar a arte para as ilhas do Japão Central. Claro que o título de "pai do karaté moderno" enche muito o peito de quem for da linha shoto, mas como se sabe, é apenas uma abreviação ou simplificação histórica.

    Maria Camarão,

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  5. Disse eu no comentário anterior que "a etiqueta deve ser treinada e deve ser descodificada para se ficar a saber o seu verdadeiro sentido. E deve ser cumprida." Corrijo agora: para se ficar a saber e a conhecer o seu verdadeiro sentido.

    Se o aluno não sabe para que "aquilo" serve, porque nunca lhe foi explicado, por que motivo há-de fazer? Ou cai numa de imitação ou numa de não te rales... Mas quantos treinadores se preocupam em pesquisar porque é que há uma saudação sentada e outra de pé? Quantos treinadores explicam aos seus alunos o significado dessa saudação?

    Felizmente temos aqui duas pessoas (dois Mestres) que se preocupam com isso!

    Um abraço a ambos
    JA Neves

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