terça-feira, 8 de junho de 2010

O Karaté ao som da poesia (II)...

Respondendo a várias solicitações de comentadores deste blog (Rafael Loureiro, Luís Sérgio, Fernando Gonçalves e Ricardo Prelhaz), vou tentar demonstrar como a poesia reflecte o actual estado do Karaté no nosso País.

Houve eleições para a FNK-P em 2007. Duas listas concorrentes: uma liderada por Nuno Cardeira, outra por João Salgado. Ganhou a segunda, ponto final, pensávamos nós...

Foi épico, agora é hípico...

A 25 de Maio de 2009, a JKF Goju-Kai Portugal (não confundir com a Goju-Kai liderada por António Santos e Abel Figueiredo, essa sim, representante da sua congénere do Japão) enviou um e-mail ao Presidente da Mesa da Assembleia Geral da FNK-P, com conhecimento a várias Associações, onde, a certa altura, no ponto 4 (O estado actual do karate nacional), se podia ler, nas seguintes alíneas, o seguinte:

a. O karate está hoje nas mãos de professores de educação física e de algumas pessoas que dele pouco sabem.

d. Todos devem ser tratados da mesma forma. Os lugares directivos devem ser ocupados pelo mérito e valor dos respectivos titulares e não por pessoas cujo único objectivo é defender os interesses das associações maioritárias em votos e menos maioritárias tanto em resultados como na participação de eventos a nível nacional.

Do ponto 5 (Conclusões) transcrevemos a segunda alínea:

b. Seguramente, uma das melhores gestões da história da Federação, digam o que disserem, foi a realizada por Humberto Oliveira. Temos menos votos, é certo, mas é às pessoas válidas da nossa “lavra” que as grandes associações têm recorrido, o que nos honra imenso (a título de exemplo, nesta direcção e na formação, Abel Figueiredo e Armando Inocentes; ao nível europeu e apenas no que respeita ao passado recente, o treinador José Carvalho). Outras associações com peso reduzido têm igualmente apresentado resultados significativos que enriquecem a modalidade, por vezes chegando a contrastar com os resultados (não) obtidos pelas grandes associações.

E-mail esse assinado por M. Costa, em nome da Direcção dessa Associação.

Sendo eu na altura Director do Departamento de Formação da FNK-P, respondi ao mesmo a 26 de Maio, a título particular e puramente pessoal, com o seguinte teor:

“Exm.º Senhor M. Costa

Tive a oportunidade de ler atentamente o e-mail que V.ª Ex.ª me enviou e cumpre-me fazer algumas correcções naquilo a que me diz respeito, o que faço a título meramente pessoal.

Afirma V.ª Ex.ª que «o Karaté está hoje nas mãos de professores de educação física e de algumas pessoas que dele pouco sabem». Penso ser uma afirmação generalista e incorrecta. Se por acaso se refere ao facto de muitos dos formadores serem Licenciados em Educação Física e Desporto (que não é o mesmo que serem «professores de educação física») engana-se, pois os mesmos não têm poderes deliberativos nem executivos. E convém esclarecer que possuindo esses formadores essas habilitações, não há nenhum deles que não possua um CT independentemente do seu grau. Quanto às suas graduações, se tem estado desatento, vão de 2º a 7º Dan. Se por acaso se refere ao facto de um director também possuir o mesmo grau académico, e simultaneamente ser Mestre em Gestão da Formação Desportiva, não é um voto a mais ou a menos na Direcção que fará com que o “Karaté esteja nas suas mãos”.

Continua V.ª Ex.ª a manifestar um sintoma paradigmático existente não no Karaté, mas nas pessoas que praticam Karaté em Portugal: confunde-se competência técnica com competência pedagógica e ignora-se a competência deontológica.

Quanto ao facto das pessoas saberem ou não de Karaté, ou que «dele pouco sabem», não sei quais são os parâmetros em que se baseia para determinar quem sabe ou não sabe, quem sabe muito ou sabe pouco... A graduação? O nível de treinador? Os títulos obtidos? Os títulos dos alunos? A formação académica? Os anos de prática (ou os anos de rotina e de vícios)?

Mais um sintoma paradigmático da maioria da nossa comunidade: confunde-se a filo com a epistéme, o saber com o conhecer, confunde-se competências com atributos e ignora-se o desempenho, a eficácia e a eficiência.

Já agora, quem são as pessoas em Portugal que “sabem de Karaté”?

Quanto ao articulado que aborda «uma das melhores gestões da história da Federação, digam o que disserem», de facto o «digam o que disserem» é reversível, pelo que se aplica também a quem o diz.

Mas a afirmação demonstra na realidade falta de alguns conhecimentos, o que aliás é também manifestado no e-mail de V.ª Ex.ª de 17 de Abril.

Só como exemplo, por acaso sabe por que é que em 1994 “uma das melhores gestões da história da Federação” não aceitou a inscrição dos atletas de um dojo de uma Associação por existir um contencioso entre os dirigentes (técnicos e administrativos) desse dojo e de uma outra Associação, num processo que nem tinha sido despoletado pela própria Federação nem a ela dizia respeito? Ou por que motivo a acta de reunião de Direcção que tal deliberava nunca foi apresentada?

Quando V.ª Ex.ª refere «as pessoas válidas da nossa “lavra”», talvez fosse melhor não recorrer a um argumento que parece roçar as raias do doentio, de tantas vezes se recorrer a ele. Isto porque no caso presente não se trata de mais “lavra” ou menos “lavra” quando essa “lavra” era inexistente.

A psicose de quem ensina quem também sido paradigmática nas pessoas que se movimentam no seio da nossa modalidade. Mas curiosamente o paradigma de quem aprende com quem tem andado afastado... O facto de se pertencer a uma Associação ou o facto de se participar num ou noutro estágio não transforma automaticamente o associado ou o praticante em “aluno” do Instrutor-Chefe (Director Técnico ou Presidente do Conselho Técnico conforme a terminologia, ou até “Mestre”). Ser-se “Mestre” de alguém implica ter competências e conhecimentos mas sobretudo saber ensiná-los e transmiti-los contribuindo para a consequente aprendizagem e formação desse “alguém”. Mas se o acto de ensinar não implica o acto de aprender, a aprendizagem também não é obrigatoriamente fruto de uma “lavra”.

O reclamar-se “ser sucessor de” por motivos de projecção e de imagem, assim como o reclamar-se “ter sido Mestre de” para se tentar associar aos louros de outros coloca essas pessoas numa situação que demonstra a fragilidade existente num complexo de superioridade.

No Karaté o “Mestre” também se mede pelo número de indivíduos de craveira técnica e pedagógica que o vão abandonando ao longo dos anos, mesmo que alguns deles nada tenham aprendido com ele. Por algum motivo será... E também por algum motivo será que alguns desses indivíduos só são reconhecidos e têm alguma projecção após se libertarem do jugo de certas organizações...

Por acaso sabe V.ª Ex.ª como foram seleccionados os competidores para o Campeonato Europeu de Goju-Ryu em 1991? Onde estava V.ª Ex.ª nessa altura?

Por acaso conhece V.ª Ex.ª o que ocorreu com a arbitragem no Campeonato Europeu de Goju-Ryu em 1993? Por acaso conhece V.ª Ex.ª os motivos pelos quais Portugal não revalidou um título nesse mesmo Campeonato? Por acaso sabe com que meios económicos os atletas se deslocaram à Letónia?

Por acaso sabe por que foram alguns praticantes de Karaté portugueses expulsos da IOGKF, da OGKK (de Okinawa, no Japão) ou da JKF Goju-Kai (do Japão) e por que motivos? Onde estava V.ª Ex.ª em 1982?

Provavelmente são perguntas a mais para respostas a menos. Daí o ser fundamental conhecer e estar bem documentado sobre aquilo que se diz ou sobre aquilo de que se fala.

Com os meus respeitosos cumprimentos,

Armando Inocentes”

Vem-me agora à ideia Makarenko, quando dizia:

Já não há imbecis
Para, multidões boquiabertas,
Esperar que caia dos lábios do «mestre» uma palavra.


A 7 de Julho de 2009 recebi a resposta ao meu e-mail, desta vez não assinado, mas proveniente do mesmo endereço – JKFPortugal – o seguinte mail, enviado para mais 31 endereços:

Armando Inocentes
Exmo. Senhor,
Em resposta a sua carta de fins de Maio, venho dizer o seguinte.
(...)
Relatei factos, pois uma federação não é uma associação e o Senhor veio responder como que em defesa de um sistema já obsoleto há muito.
A sua actuação só demonstra o estado da federação e dos seus corpos dirigentes; a sua resposta só nos dá razão particularizando e personalizando tudo. Avaliamos quem lá está agora e não os que estiveram - esses já foram julgados.
Combatemos o sistema para que deixe de ser para amigos, para a defesa de interesses e para o protagonismo de alguns.
Mas voltemos à mensagem que origina a presente missiva.
A carta que V. Ex.ª enviou tem tanto de pretensioso, quanto de desconhecimento. No entanto, nenhum deles merece resposta: o pretensiosismo reclama humildade; o desconhecimento pede informação. Ministrar uma e outra não é minha responsabilidade no presente caso.
Não posso, porém, deixar passar sem reacção um outro atributo da referida carta: a insolência com que se refere aos Mestres de karate. E faço-o, não por se tratar do Sr. Inocentes (pessoa que tenho o prazer de não conhecer, condição em que pretendo permanecer), mas sim pelo cargo de responsabilidade que Vexa ocupa na estrutura organizativa do karate nacional (FNK-P).
O karate é muitas coisas, mas é acima de tudo respeito e lealdade para com os Mestres. Aprendi-o no primeiro dia em que entrei num Dojo. Nesse dia disseram-me que devia fazer uma vénia antes de entrar. Desde então tenho cultivado esse ensinamento.
Para o meu Mestre, reservo o maior respeito e a mais genuína lealdade. O Sr. Inocentes reservará o que entender. Tenho, porém, de realçar o seguinte: colocar em questão a relação de aprendizagem entre o Mestre e o seu aluno e ir até ao ponto de enaltecer o abandono dos Mestres pelos respectivos alunos é negar aquele princípio, que é o primeiro, do karate: o do respeito, o da lealdade. Quem subscreve tal actuação poderá saber de muita coisa, poderá ter muitos títulos académicos, poderá até ostentar muitos dans, porém, nada sabe de karate.
Destarte a história se encarregará de provar a verdade dos factos e esses factos embora alguns queiram apagar haverá sempre alguém que se lembre deles.
Afortunadamente há em Portugal muitas associações de Karaté composta por elementos de muito valor quer técnico quer humano, sendo muitos desses elementos a própria história.
O “Mestre” será sempre o Mestre, quer ainda seja o nosso ou não!!! Por isso defeitos todos temos mas “dissonância cognitiva” não é de certeza o nosso e os actos, esses ficam com quem os praticam!!!
Dito isto, irei colocar a carta de V. Exª no local que lhe pertence por natureza: na lixeira.
Saudações


Como se pode constatar, nem o Sr. M. Costa respondeu às questões que eu lhe coloquei (talvez por não ter o prazer de me conhecer e nessa condição pretender permanecer), como ainda afirmou que eu respondi “como que em defesa de um sistema já obsoleto há muito”, quando frisei que o tinha feiro a título meramente pessoal, para a seguir colocar a minha carta “no local que lhe pertence por natureza: na lixeira.” FEZ muito bem!... A sua carta contínua a estar por mim guardada! E eu até teria todo o prazer em conhecê-lo para podermos trocar opiniões pessoalmente...

Mas o mais curioso é que um ano depois, a 20 de Maio do corrente, a Associação JKF Goju-Kai Portugal envia um novo e-mail intitulado “Carta para associações membros da FNK-P”, desta vez assinado por M. Marques em nome da Direcção, subordinado um título com 3 pontos: “Impugnação da Assembleia-geral (AG) de 23 de Agosto de 2009, Demissão do Secretário-geral e Director do Departamento de Formação (DF) e Queixa-crime contra a Direcção da FNK-P”.

No que me diz respeito, nunca fui Secretário-geral de nada, cargo que nem existe na FNK-P, tendo-me demitido da Direcção da FNK-P, onde era Secretário da Direcção e ocupava as funções de Director do Departamento de Formação, em Novembro de 2009, como é sabido.

Mas nesse e-mail, curiosamente, e ao contrário dos anteriores, afirma-se, após extensas considerações:

Mas o pior é fecharmos os olhos a tudo isto, como diz e muito bem, Armando Inocentes que teve a coragem de, com a verdade, trazer à luz acontecimentos passados e actuais. Teve ainda a coragem de se demitir, demonstrando que nunca esteve agarrado ao poder, fazendo-o, a bem do Karate.

Para o mesmo finalizar com um “Bem - haja muitos como o Senhor, Dr. Armando Inocentes.

Eis como de repente de besta se passa a bestial...

CONCLUSÃO: dois directores da mesma Associação com opiniões diferentes sobre uma mesma pessoa, mas ambos assinados em nome da mesma Direcção! Numa situação defendo um sistema já obsoleto há muito, e a minha carta vai para a lixeira! Noutra situação sou colocado nos píncaros e demonstro que nunca estive agarrado ao poder... Ou porque numa altura ocupava um cargo e na outra já nele nada representava por iniciativa própria. Ou então não é a pessoa que se coloca em causa, mas pretende-se colocar a instituição em causa através dessa pessoa. Utiliza esta Associação os meus motivos de demissão, que tornei públicos após a mesma e tendo de tal dado conhecimento ao Presidente da FNK-P, para avançar com uma queixa-crime quando a mesma poderia em Assembleia-Geral – onde se fez representar – ter questionado a Direcção e ter analisado o Relatório e Contas em discussão e inquirir ou verificar os documentos que desejasse (o que não fez!). Moral da história: é mais fácil utilizar terceiros para atingir os seus fins...

É a diferença entre cavalgar e ser cavalgado... quando é o cavalo que monta o cavaleiro.

De facto, apetece saltar p’rá lua e ...

Sobre o segundo ponto, o Campeonato Europeu de Regiões, quando participei na 1ª Assembleia-Geral da FNK-P, nos finais de 2007, um treinador houve que proclamou alto e bom som que “em Portugal 90% dos treinadores «são covardes»”. Ficámos sem saber, mas presumivelmente esse treinador estaria nos outros 10%.

Na página da net da FNK-P podemos ver que “decorrem no Conselho Disciplinar dois processos que foram objecto de recurso. Aguarda-se a decisão do Conselho Jurisdicional.” Enquanto se aguarda o recurso, a decisão do Conselho Disciplinar permanece suspensa e os visados continuam em funções (há quanto tempo? Funciona o CJ? Já prescreveu o processo?).

Quem criticou o Seleccionador Nacional, Joaquim Gonçalves, numa Assembleia-Geral em que este até nem esteve presente, sobre os relatórios que o mesmo elaborava de cada prova em que participava a Selecção Nacional e onde este até utilizava o termo «murros supersónicos», deveria agora apresentar um relatório sobre a prestação da equipa que esteve presente na Polónia, para termos conhecimento do desempenho dos competidores portugueses. Mas como nem o próprio dilúvio foi eterno, um dia as negras águas partirão....

E volto mais uma vez a recordar-me de Makarenko:

Primeiro
É preciso
Transformar a vida
Para cantá-la
Em seguida.

1 comentário:

  1. Sabes que passar de "besta" a "bestial" não custa muito... Basta que alguns "energúmenos" (leia-se pessoa ignorante ou muito básica), se passem a considerar inteligentes e se ponham a opinar sobre assuntos que desconhecem totalmente. Não eleves muito o estilo literário senão ninguém te percebe - nem mesmo as bestas! Bjinhos

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